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Renata Mendes no Estadão: Para ser justo, reforma tributária já

Renata Mendes no Estadão: Para ser justo, reforma tributária já

Artigo de Renata Mendes, líder do Pra Ser Justo, publicado no Estadão em 17.12.2020.

Desde a promulgação da Constituição Federal, em 1988, o país teve oito presidentes da República. Suas políticas e orientações ideológicas foram as mais diferentes possíveis. Apenas um aspecto não mudou ao longo de todos estes governos nestas três últimas décadas: a reforma tributária sempre esteve em pauta. E, infelizmente, jamais saiu do lugar. Chegou a hora de mudar essa história.

Parece anedótico, mas é verdade. Tão logo a Constituição foi promulgada, começaram as conversas sobre a necessidade de reformar o texto. A constatação de então persiste até hoje: em se tratando de tributos, o Brasil tem um dos sistemas mais complexos, anacrônicos e ineficazes do mundo. De lá pra cá, só piorou. Não há, portanto, razão para continuarmos a insistir no erro.

O Congresso Nacional tem agora uma chance histórica de, enfim, implantar um novo sistema de tributos no país. Um modelo que seja mais justo, mais transparente, mais simples, mais progressivo. A reforma tributária tem tudo para se configurar num potente instrumento de ataque às desigualdades, de promoção do crescimento e da geração de emprego, renda e oportunidades. É o que o país mais precisa neste momento.

O assunto é árido e este foi um dos motivos pelos quais a reforma nunca avançou. Se ninguém entende, poucos se mobilizam. Mas tributos são a forma mais direta de exercício da cidadania. Envolvem as formas como as políticas públicas são desenhadas, como as empresas competem e barganham com o Estado, como os cidadãos participam e são (ou não) atendidos pelo poder público em resposta ao que recolhem aos fiscos.

Ou seja, tributos afetam as pessoas, as empresas e a forma como os governos lidam e melhoram (ou não) a vida delas. A reforma tributária traz ganhos para toda a sociedade e, por isso, os benefícios coletivos devem sobressair em relação aos interesses individuais ou de alguns grupos.

Foi com esta motivação que nos juntamos neste movimento. O Pra Ser Justo foi criado porque consideramos que o Brasil pode ser melhor, menos desigual e mais justo para aqueles que querem trabalhar e inovar. Uma país que volte a crescer e que seja mais amigável com quem empreende. Para isso, a reforma tributária é imprescindível. Razões para modificar o nosso sistema não faltam.

O Brasil está na contramão do resto do mundo. Enquanto 168 países têm apenas um tributo incidente sobre o consumo de bens e serviços, nós temos cinco. Enquanto a norma bem-sucedida em qualquer parte do planeta é ter uma legislação só, aqui temos milhares, que mudam quase todo dia, de forma pouquíssimo transparente.

A reforma que defendemos tem um princípio básico e simples: quem tem mais precisa pagar mais. Hoje, não é isso que acontece. As desonerações dadas aos mais diversos produtos e serviços beneficiam os mais ricos, não conseguem reduzir as desigualdades e geral um custo alto para toda a sociedade, que, assim, tem menos recursos para investir em políticas públicas.

As propostas em discussão no Congresso têm condições de começar a atacar o problema. Tornam o sistema mais simples: unificam cinco tributos (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS) em um só, adotam alíquota única, com legislação também única para todos os estados e municípios. Todo o emaranhado hoje existente será substituído por apenas um imposto de valor agregado, como o mundo todo já ensinou que funciona.

Além disso, um mecanismo já testado no Brasil garantirá muito mais justiça social: tributos pagos por inscritos no CadÚnico serão imediatamente devolvidos a seus pagadores. É uma forma muito mais direta de reduzir desigualdades. Pelo caráter focalizado desse dispositivo, o novo sistema tributário poderá transformar-se em parte importante das políticas de transferência de renda praticadas com sucesso no país nas últimas décadas.

Mas para conseguirmos aprovar uma boa reforma, devemos priorizar alguns pilares e valores. São eles: ser instrumento de justiça e combate às desigualdades; incentivar a geração de empregos e o empreendedorismo; colaborar para o crescimento e o aumento da competitividade do país; ser um sistema simples, transparente e de fácil compreensão; e promover cidadania, com mais retornos para a sociedade na forma de bens e serviços públicos de melhor qualidade.

O Brasil encontra-se num momento decisivo da sua história. Temos que reencontrar o rumo que nos faça avançar e nos tire do atoleiro em que nossa economia vem patinando há anos. A reforma tributária é parte indispensável dessa receita. As propostas em tramitação no Congresso estão maduras e já aprendemos o que tínhamos para aprender com o que dá certo no resto do mundo. Todos perdemos com cada dia a mais de demora. Não podemos esperar mais. Pra ser justo, a hora é agora.

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