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A reforma tributária fatiada é mesmo a reforma possível?

A reforma tributária fatiada é mesmo a reforma possível?

Artigo de Renata Mendes, líder do Pra Ser Justo, publicado no  Estadão em 22.05.2021.

Um bom sistema tributário é simples, transparente, reduz desigualdades e impulsiona o crescimento das empresas e dos países. A tributação brasileira sobre o consumo, no entanto, não oferece nenhuma dessas características. Por causa de todas as disfunções de nosso sistema tributário, há 33 anos discutimos uma reforma tributária no Brasil. No atual governo, o debate está emperrado há quase dois anos. Enquanto esperamos a tão necessária reforma, o país segue sendo prejudicado por um sistema que impede o crescimento e amplia as injustiças sociais.

Neste mês, tivemos um importante passo rumo à construção de um sistema tributário mais justo a apresentação do relatório substitutivo do Deputado Aguinaldo Ribeiro (PP/PB), elaborado no âmbito da Comissão Mista de Reforma Tributária. A proposta unifica os cinco tributos sobre o consumo (PIS/COFINS, IPI, ICMS e ISS) em um Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), modelo que é usado em mais de 168 países e recomendado como o mais eficiente por diversas organizações internacionais.

O relatório do Deputado Aguinaldo Ribeiro é um importante sinal do amadurecimento do debate sobre a Reforma Tributária e reflete o trabalho árduo realizado pela Comissão Mista, que deu voz aos entes federativos, setores econômicos, especialistas e parlamentares ao longo de centenas de horas de reuniões e audiências públicas sobre o tema. Todo esse trabalho permitiu a formação de consensos em torno de uma reforma tributária ampla, endossada por importantes atores no tema: Comsefaz, CNM, Febrafite, CCiF, Destrava Brasil,Pra Ser Justo, e outras 48 associações que representam diversos setores da economia. Na Câmara e no Senado não é diferente. Segundo o placar elaborado pelo Movimento Pra Ser Justo e pela Arquimedes, 42% dos deputados e 60% dos senadores já se posicionaram favoravelmente à reforma tributária nas redes sociais, enquanto apenas 14% e 20% se posicionaram a favor da reforma fatiada do governo, respectivamente.

O relatório apresentado é uma importante base para o debate da reforma tributária em suas próximas etapas de tramitação. Ele promove a simplificação do sistema, não apenas por unificar os cinco principais tributos da base consumo, mas também por unificar a legislação e padronizar o emaranhado de regras que existem atualmente. Promove também uma tributação mais neutra, pondo fim à diferenciação entre bens e serviços, incompatível com a nova economia e com empresas inovadoras. Por fim, ele reduz desigualdades ao distribuir melhor os recursos entre estados e municípios, reduzindo as disparidades regionais, e ao prever a devolução dos tributos pagos pelos mais pobres, mecanismo que é 12 vezes mais efetivo para reduzir desigualdades que as isenções que são concedidas atualmente.

É possível traduzir esse impacto em números: segundo dados do CCIF e IPEA com a reforma ampla o PIB brasileiro pode crescer 20% nos próximos 15 anos; a dívida pública pode cair para 30% do PIB; 80% dos municípios brasileiros terão mais recursos para investir em políticas públicas e as pessoas terão um aumento médio de renda de 17%, sendo esse valor maior para a população de até 8 salários mínimos.

Se existe vasto apoio à reforma tributária ampla e se os impactos são tão significativos para a economia e a sociedade, por que ainda existem atores que insistem em um projeto menor e com impactos reduzidos?

Apenas uma reforma tributária ambiciosa, que englobe não só os tributos federais, mas também os estaduais e municipais, será capaz de pôr fim aos problemas e injustiças do nosso sistema tributário e alinhá-los às melhores práticas internacionais. Se há 30 anos a reforma fatiada já seria insuficiente para desatar o nó do sistema tributário brasileiro, a necessidade de uma reforma ampla foi ainda mais reforçada pela pandemia, a pior crise sanitária, econômica e social que o Brasil enfrenta no século, e que torna ainda mais urgente a necessidade de gerar crescimento e reduzir desigualdades. Nesse momento, temos o dever e a oportunidade de corrigir problemas históricos e de assumir um compromisso não apenas com o que é possível, mas com o que é incontestavelmente necessário para desenvolver o nosso país e a vida de todos (as) os (as) brasileiros(as).

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